Theresa Catharina de Góes Campos

     
 OS OLHOS DE RHUAN

Seu retrato tem aparecido no jornal. Aparência franzina, seus olhos redondos e escuros, de olheiras profundas, aparecem tristes e inquiridores. Como a perguntar por que nada fizemos em relação ao seu sofrimento. Um longo sofrimento, nas mãos de duas macabras e perversas mulheres. Na reportagem afirmam que dor, humilhação e tortura marcaram os últimos cinco anos da vida de Rhuan Maycron. Sem escola, sem amigos, sem sair de casa, submetido diariamente a uma morte lenta. Durante a qual teve pênis e testículos cortados. Por fim, foi morto a facadas. Seu corpo esquartejado. A irmã, submetida a maus tratos. Sem ninguém perceber.

Foram cinco longos anos, durante os quais, as duas marginais permaneceram incólumes a ação de familiares e da Polícia. Mesmo dando golpes em cada casa que ocupavam, deixando o aluguel por pagar. Mesmo sendo duas mulheres enormes, fisicamente bem visíveis, estranhas no comportamento. Incrivelmente, não foram notadas nem na Igreja que frequentavam todos os domingos. Que Igreja é essa? A família parou de procurar Rhuan e sua irmã. Todos desistiram. Os familiares e a sociedade. Todos permaneceram cegos e eles invisíveis, a sofrerem na carne um sofrimento renovado a cada dia. Essa mesma indiferença estava presente nas instituições abordadas pela reportagem. Como o Conselho Tutelar, preocupado em se justificar, numa atitude defensiva. Sem avaliação crítica de sua atuação. Sem assumir responsabilidades. Apenas apontando as próprias carências. E esquecendo os casos que se somam, diariamente, de maus tratos, violência contra as crianças e assassinatos.

Não temos mais tempo. Muitas crianças já morreram por nossa indiferença.
Onde estão as Políticas Públicas, cujos objetivos e estratégias procurem prevenir este quadro horripilante da sociedade brasileira? A Avaliação e a Supervisão do que vem sendo feito? O serviço comunitário que permita visitas domiciliares, sempre que novos habitantes da comunidade chegarem sem colocar os filhos na escola? Ou um serviço de Emergência que receba denúncias, mesmo as anônimas? Voltado essencialmente para a violência contra as crianças; atento, fiscalizador, com ação imediata sempre que algo pareça estranho e anormal. Com poder de entrar em residências e observar as crianças em situação de risco? Grupos de voluntários nas escolas para identificar essas situações? Por fim, uma pergunta: os três irmãos que restaram, depois do assassinato de um deles, foram entregues à mãe, dependente de drogas e sem recursos?

LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO
14 de jun de 2019
 

Jornalismo com ética e solidariedade.