Theresa Catharina de Góes Campos

     
MULHERES IMPORTANTES PARA A CULTURA, EM UBERABA, MG
 
(Artigo solicitado pelo Instituto Lamar Lamounier)
 
Essa é, de fato, uma grande lacuna, que precisa ser reparada, a da valoração do empenho feminino, pela evolução cultural da cidade de Uberaba 
( MG ), onde só se reconhece, com algumas poucas exceções, o trabalho masculino, nos nem sempre criteriosos relatos históricos da cidade. 
 
As mulheres, entretanto, marcaram presença, e efetiva atuação, em quase todos os setores da vida cultural uberabense - mesmo, em outros centros culturais do país, e do exterior -, destacando-se, entre eles, o da música, o do magistério, o da área jurídica, o da moda, o da medicina, o das artes plásticas, o de assistência social, o da política, o da locução radiofônica, o do teatro, o da pesquisa histórica e  folclórica, o da literatura ( prosa e poesia), o do jornalismo, e o da pecuária, por tradição, dominado por homens.
 
O primeiro destaque é para Dinorah ( ou Dinorá ) de Carvalho, pianista e compositora ( 1895-1980 ), que viveu pouco tempo na cidade, pois logo, sua família se mudou para São Paulo, como aconteceu também, com a do seu sobrinho, Joubert de Carvalho, que foi, primeiro, igualmente, para São Paulo e, depois, para o Rio de Janeiro. 
 
Na Capital paulista, Dinorah matriculou-se no Conservatório de Música, onde teve como colega, e amigo, Mário de Andrade, um dos organizadores da Semana da Arte Moderna, de 1922. Dinorah, ao se formar, em piano, com as melhores notas, no Conservatório, recebeu bolsa de estudos, na França, do governo de Minas Gerais.

Em Paris, Dinorah aperfeiçoou seus estudos, com Isidor Philipp. Ao retornar a São Paulo, foi apresentada, por Mário de Andrade,  ao professor e maestro Lamberto Bardi, com quem aprimorou seus conhecimentos de composição e regência. Ela criou, na Capital paulista, uma escola de música, que levava o seu nome. Nos anos de 1960, o maestro Souza Lima, que conheci, organizou, no Teatro Municipal de São Paulo, um Festival Dinorah de Carvalho. Entre suas principais peças, que são quase quatrocentas, se destacam: " Missa De Profundis ", " Três Danças Brasileiras "," Serenata da Saudade ", " Arraial em Festa " e " Noite de São Paulo ", essa sobre um texto do poeta Guilherme de Almeida, de quem era também muito amiga. 
 
Nair Carvalho Medeiros, também pianista, da mesma família de Joubert de Carvalho, e de Dinorah de Carvalho, teve, como seus ilustres parentes, carreira brilhante, como concertista, no país, e na França, onde se casou e, em Paris, permaneceu morando.
 
No campo da música, nas décadas de quarenta, e, parte da de cinquenta, a figura feminina mais expressiva, era a da professora Odete Camargos, embora se dedicasse mais ao magistério musical ( canto coral ), na Escola Normal Oficial, e, de piano, em casa, onde tinha muitas alunas e alunos, competindo, naturalmente, com o grande nome da música uberabense, Renato Frateschi, que deixou mais de 400 composições musicais. Em meu livro de memórias, "As Raparigas da Rua de Baixo", assim tento fazer a figuração de Dona Odete Camargos:
 
"A palavra " enérgica " era tida, na época, como a mais fluente e adequada para designar um bom mestre, um bom educador. Quando se dizia que alguém era " enérgico", já se entendia tratar-se de um bom profissional de ensino, ou seja, que sabia impor seus conhecimentos aos seus alunos. Tal era o caso, sem dúvida, de Dona Odete, que, de exemplar maneira, não só parecia trazer estampada a palavra " enérgica", na testa - emoldurada por uma cabeleira meio grisalha -, como envergar, bem ao seu estilo, uma postura rígida e austera."
 
Em 1949, Dona Odete, em sociedade com a pianista Mirthes Bruno, criou  o Instituto Musical Uberabense, quase ao mesmo tempo, em que o casal Alberto Frateschi e Alda Loes Frateschi fundaram o Conservatório Musical de Uberaba, atualmente, denominado Conservatório Musical " Renato Frateschi ". Por ambas instituições, formaram-se várias pianistas, que abrilhantaram, na ocasião, o panorama musical de Uberaba. 
 
Maria Emília Osório, que, logo depois de se tornar a primeira formanda, pelo Conservatório Musical de Uberaba, mudou-se para Brasília, onde aprimorou seus estudos, com a pianista e compositora Neusa França, e com o professor Ney Salgado, além de fazer várias apresentações, na Capital da República. Maria Emília é neta do maestro Carlos Maria do Nascimento, um dos regentes da Banda União Uberabense, e filha de Sylvia Nascimento, a qual, como atriz, integrou, na década de trinta, o Grupo Arthur Azevedo, responsável por diversas montagens de textos teatrais, de autores brasileiros, no antigo Cine Royal, sob a direção de Renato Frateschi.

 
Valmira Cardoso, de apurada técnica pianística, dedicada às interpretações dos românticos, Chopin e Debussy, se apresentou, em diversos concertos, no Jockey Club de Uberaba, mas, frágil de saúde, cedo, desapareceu. O  mesmo aconteceu, com Isa Lais Bernardes Ferreira, neta, como eu, do maestro Eloy Bernardes Ferreira, também regente da Banda União Uberabense, a qual se transferiu, logo, para Belo Horizonte, fez uma única apresentação, no Teatro Francisco Nunes, como solista, acompanhada pela Banda Musical do Corpo de Bombeiros da cidade, assumiu o magistério, no Conservatório Musical de BH, e morreu, prematuramente, três anos depois de formada. 
 
Outro nome de destaque, entre as pianistas da época, é o de Lélia Bruno Sabino, que, além de várias apresentações, na cidade, mais tarde emprestou o seu talento como escritora de crônicas, e diretora do Arquivo Público Municipal, criado em 1985. 
 
Atualmente, o grande nome da música, em Uberaba, é o da maestrina Olga Maria Frange de Oliveira, graduada, em piano, pelo Instituto Musical Uberabense e, como instrumentista, pela Faculdade de Artes, da Universidade Federal de Uberlândia. E pós-graduada, em Cultura e Arte Barroca, pela Universidade de Ouro Preto, além de bacharel, em Direito, pela Universidade de Uberaba - Uniube. Ex-Diretora Geral da Fundação Cultural de Uberaba, onde foi também conselheira da área de música e de dança,  e diretora cultural. É professora de piano, percepção musical e canto coral. Escritora de crônicas para o " Jornal da Manhã" e conferencista - no Brasil e, no exterior: na França ( Universidade da Sorbonne ), e, em Portugal, a convite do governo, tendo, no país, trabalho, publicado pela Fundação Coluste Gulbekian, sobre " A Modinha e o Lundu, no Período Colonial".
 
É também a maestrina Olga Maria Frange de Oliveira regente do Coral Artístico Uberabense, que inaugurou, recentemente, o Coro da Igreja de São Domingos. Pesquisadora emérita, ela prepara, atualmente, para ser lançado, em março do próximo ano, durante as comemorações do bicentenário da cidade, o livro " Os Pioneiros da História da Música, em Uberaba", abrangendo o início do século XIX ( 1815 ), com a criação da Banda dos Bernardes, primeira expressão artística da cidade, fundada por Silvério Bernardes Ferreira, meu antepassado, no Arraial da Capelinha e, depois, transferida para Uberaba. A pesquisa da maestrina se estende até a década de 1980  ( século XX ), com a morte dos últimos pioneiros.
 
Entre cantoras, destaca-se o nome de Honorina Barra, que, também, viveu pouco tempo na cidade, pois, com apenas seis anos, mudou-se com a família para Goiânia, onde, logo, começou a se destacar, como cantora lírica ( soprano ), sendo sempre convidada, pelo governador, Pedro Ludovico, 
a se apresentar, nas solenidades oficiais do Estado de Goiás. Mudando-se, depois, para o Rio de Janeiro, aprimorou seus estudos de canto, na Escola Nacional de Música, fazendo, depois, diversas apresentações, no Teatro Municipal e, na Rádio do Ministério da Educação. Dos quinze concursos, dos quais participou, ganhou quase todos eles. Regressou, mais tarde, a Goiânia, onde assumiu a vaga de Professora de Canto, da Universidade Federal de Goiás.  
 
Entre outras cantoras líricas, de expressão, da cidade, podem ser citadas: Sylvia Riccioppo ( soprano ), Cordelia Borges, Arailda Gomes Alves ( soprano ligeiro ) - também escritora, cronista de muito fôlego, com vários livros publicados, entre eles, " A Voz Que Pensava Demais", " Poetas Del Mundo em Poesias " e  "A Saga dos Frateschi" -, Dora Bellochio, Adelaide Novaes, que se apresentou, em diversos recitais, em Belo Horizonte,  e Eleusa Fonseca ( sopranos ligeiros ). Essa ultima foi  também, atuante agente cultural, criadora do Núcleo Artístico e Cultural da Juventude - NACJ -, entidade, que dominou as atividades artístico-culturais, na cidade, na década de cinquenta, do século passado. 
 
Eleusa foi igualmente a criadora do " Presépio ao Vivo", encenando, com crianças, durante dois, ou três anos, consecutivos, as cenas do nascimento 
de Cristo, nas escadarias da Catedral, uma tradição, que deveria ter sido mantida.  Como atriz, ela integrou o Departamento de Teatro do NACJ, participando das montagens de " Casa de Bonecas ", de Henrik Ibsen, sob minha direção, e de " Assim é, se lhe Parece", de Luigi Pirandello, sob a direção de Petronio Borges. Outras atrizes, que, como Eleusa, se projetaram, na referida instituição, foram: Lígia Varanda, Irene Dias, Terezinha Teixeira e Venina Nunes. 
 
Por não ter conseguido o apoio da Câmara Municipal - impulsionada, em sentido contrário, por Alda Loes Frateschi, e pelo vereador Dioclecio Campos - para a construção, na Praça de Santa Rita, do Teatro de Alumínio, projetado por Germano Gultzgolf, cuja construção tinha recursos aprovados pela Assembleia Legislativa do Estado, decepcionada, Eleusa abandonou, de vez, suas atividades culturais e, infelizmente, anos mais tarde, por exercer a benemerência, a quem não a merecia, teve morte, de forma trágica, violenta.
 
Na linha de cantoras populares, deve ser citada ainda Martha Mendonça, nome artístico de Irenice Mendonca Ferreira, nascida, na cidade, em 1940, que alcançou certo tipo de popularidade, em São Paulo, por ser casada com o cantor capixaba Altemar Dutra, morto prematuramente.
 
Vale aqui ressaltar a importância, que Dona Quita Próspero deu ao desenvolvimento da cultura e das artes, em Uberaba, durante o mandato de seu marido, Dr Antônio Próspero, como prefeito da cidade ( 1951 - 1955 ). De fato, nenhuma Primeira-dama, nem antes, nem depois dela, colaborou tão intensivamente, com o movimento cultural, na cidade, especialmente com o teatro - a arte, que mais amava -,  pois, foi ela a incentivadora da criação 
do Teatro do Estudante, sob a minha direção, vinculado à União Estudantil Uberabense.
 
Sob os  auspícios de Dona Quita, foi realizada a primeira, e única, Semana do Teatro, em Uberaba, que, além da encenação de vários autores brasileiros, até mesmo um do Triângulo Mineiro, contou com a presença do embaixador Paschoal Carlos Magno , recebido por ela, no aeroporto da cidade, criador do Teatro do Estudante, do Rio de Janeiro, revelador de inúmeros talentos do teatro brasileiro, como Sérgio Cardoso, Cacilda Becker, Ítalo Rossi, Teresa Raquel, Sérgio Brito e outros. A Primeira-dama se entusiasmava tanto, com o desempenho dos atores do Teatro do Estudante, que nos acompanhou, por duas vezes, para apresentações, sempre muito concorridas, na cidade de Sacramento, localizada também, no Triângulo Mineiro.
 
No setor político-administrativo da cidade, destaca-se também o nome de Helena de Brito, primeira mulher eleita, para a Câmara Municipal, graças à popularidade, que ganhou, ao criar cursos de catequese, ministrados, principalmente, por frades Dominicanos, como o Juventude Estudantil Católica - JEC -, o Juventude Universitário Católica - JUC, o Juventude Operária Católica, além de outros mais, que tinham, por sede, um edifício, localizado, na Praça do Uberaba Tênis Clube, atrás da Faculdade de Medicina.
 
A primeira modista da cidade - especializada, porém, em trajes, e adornos ( bouquets e grinaldas) para noivas,  pois, era também florista, com curso de formação, em São Paulo -, foi Dona Nair Ribeiro, criadora da loja " A Noiva ", localizada na Rua Arthur Machado, no trecho que fica entre a Avenida Leopoldino de Oliveira, e a Praça Ruy Barbosa, a qual atraia clientes de todo o Triângulo Mineiro. Dona Nair, inspiradora de Marquito, estilista uberabense, de fama internacional, especializou-se também, na arte da ornamentação de igrejas, para as cerimônias religiosas de casamento. E, posteriormente, dedicou-se ainda a criar fantasias carnavalescas, para concorrer aos prêmios dos famosos bailes do Jockey Clube de Uberaba.

 
Numa época - década de cinquenta -,  em que, antes das sessões cinematográficas, de oito da noite, aos domingos, no Cine Metrópole, acontecia um verdadeiro desfile de elegância das mulheres uberabenses, ao som da "Marcha Turca", de Mozart, outra modista famosa, especializada em vestimenta sob medida, bem como trajes de noite, era Dona Santinha Roberto, que tinha seu ateliê de costura, montado, em sua ampla residência, cercada de um vasto, e arborizado quintal, situado no bairro Estados Unidos. Dona Santinha também aderiu à feitura de fantasias para concorrer aos prêmios dos bailes carnavalescos, do Jockey Clube de Uberaba. 
 
Como os bordados estavam em alta, tanto nas fantasias carnavalescas, como, nos vestidos de noivas, e também, nos trajes de noite, o ateliê, liderado por Adélia Novaes Andrade, e suas duas filhas, Arailda e Romilda Novaes Andrade, localizado na Avenida Presidente Vargas, era o mais solicitado, o qual recebia, igualmente, alunas, desejosas de se iniciarem na profissão de bordadeira, uma das mais rendosas, de então.

 
No setor da pecuária, amplamente liderado por homens, como já disse, o nome de Dona Ibrantina de Oliveira Penna, viúva do criador José Jorge Penna, precisa ser lembrado, entre os introdutores do gado zebu, nos rebanhos do Triângulo Mineiro. Em 1920, a fazenda Cedro, origem do rebanho JJ, de propriedade do casal, importou, da Índia, dois bois, de raça apuradíssima, Africano e Lobishomem. Esse segundo conquistou, logo, o concurso da I Exposição de Gado Zebu de Uberaba. 
 
Após a morte do marido, Dona Ibrantina assumiu o comando da fazenda, tida então como matriz da raça Gir. Foi, nessa fase, que nasceu Turbante, filho de Lobishomem, que venceu o concurso Rei Zebu, promovido pela Exposição de Uberaba, considerado como o touro mais forte, produzido no Triângulo Mineiro. Dona Ibrantina foi também magnânima assistente social, pois, enquanto a situação lhe foi favorável, promovia farta distribuição de cestas de alimentos para a população mais pobre de Uberaba, nas festas de finais de ano.
 
Nomes, que merecem ser reverenciados, no setor do magistério, são os de Irma Domitila Ribeiro Borges, o de Eunice Puhler, o de Leila Venceslau Rodrigues da Cunha, todas também escritoras, e o de Lourdes Fernandes Pontes, que se dedicaram, por longo tempo,  à profissão. A primeira, durante 36 anos; a segunda, criadora e diretora do Grupo Escolar Uberaba, e, durante 30 anos, do Colégio Dom Eduardo; a terceira, durante 27 anos, lecionou Português e Literatura, na Escola Agrotécnica; e, a quarta, que permaneceu 25 anos, em sala de aula. Todas elas demonstraram uma exemplar lição de amor à profissão que abraçaram, a de ensinar, o que não é muito comum, nos dias que correm. 
 
Igual merecimento se deve reconhecer, em relação à Dona Cecília Palmério, que não só ajudou o marido, Mário Palmério, a criar, mas também a administrar, o Colégio do Triângulo Mineiro, pedra angular das Faculdades, que constituem, hoje, a Universidade de Uberaba - Uniube, onde estudei. Dona Cecília dá nome, hoje, a um centro cultural, vinculado à Uniube. Vale aqui lembrar, a propósito, que foi da Faculdade de Medicina, criada por Mário Palmério - mais tarde, federalizada por Juscelino Kubitschek -, que se graduou a primeira médica uberabense, Dra, Nilza Martinelli.
 
Mas outros nomes, da mesma têmpera, devem ser mencionados, como as irmãs, Corina e Olga de Oliveira. A primeira, foi, por longos anos, diretora do Grupo Escolar Brasil, e, a segunda, lecionou, também, por longo período, na Escola Normal de Uberaba, a língua, e a literatura francesas, pelas quais era apaixonada. Entre suas preferências literárias, figuravam Alfred de Musset e Chateaubriand.
 
Ainda, na Escola Normal, merecem citação: Laura Pinheiro, da cadeira de Ciências Naturais, Esperança Ribeiro Borges - artista plástica, como Estela Chaves, que produzia, da areia, as tintas, por ela usadas, em suas pinturas, e, também como, Sonia Carolina Batista de Andrade, poeta, escritora, artista plástica e psicanalista, hoje, radicada em Brasília, ilustradora dos próprios livros, como "Falando de Amor".
 
Outros nomes, que se dedicaram ao magistério, foram: Edith Novaes França e, sua sobrinha Adilia Novaes França; Hilda Martins; Iaiá Pontes; Terezinha Macciotti, Marília de Oliveira Magalhães - coordenadora de pessoal, da área de ensino, abrangendo mais de 20 municípios, do Triângulo Mineiro -, Maria de Lourdes Melo Praes, igualmente escritora ( " Educaderno e Caderno de Cultura ", "Administração Colegiada da Escola Pública ", " Escola: Curriculo e Ensino ",  " Escola Cidadã ", e outros ), e Geni Chaves, que escreveu uma gramática funcional e, mais tarde, mudando-se, para Brasília, criou um curso de alfabetização.
 
Tanto, na área do magistério universitário, como, na da consultoria jurídica, ou, no setor da benemerência social, um  nome, que se evidencia, na atualidade, é o da Dra. Mirto Fraga, detentora de um curriculum notável, que a credencia, sem dúvida, entre as mulheres importantes para a cultura de Uberaba. Ela estudou no Colégio Cristo Rei, na Escola Normal Estadual, e na Faculdade de Direito, da Uniube. Exerceu o magistério universitário - Direito Constitucional, Direito Público e Constitucional, Teoria Geral do Estado, Introdução à Ciência Política e Prática de Processo Civil -, na Faculdade em que se formou ( 1966 ). Ainda, na cidade, lecionou - Instituições de Direito Público e Instituições de Direito Privado -, na Faculdade de Ciências Econômicas do Triângulo Mineiro. Na Universidade de Brasília - UnB -, em substituição ao Dr. José Francisco Rezek, designado para integrar a Corte de Haia, lecionou Direito Internacional Público.
 
A Dra. Mirto Fraga exerceu a advocacia, em Minas Gerais, de 1962 a 1976. Foi consultora do Instituto de Pesquisas, Estudos e Assessoria, do Congresso Nacional, e integrou o Ministério Público, de 1977 a 1985. Foi Assessora, na Câmara do Deputados e, no Senado Federal, e Consultora da Advocacia-Geral da República. Integrou diversos Grupos de Trabalho e participou de várias missões, no exterior, como integrante, por exemplo, da Delegação Brasileira, nas negociações do Tratado de Extradição, com a França. Tem inúmeros trabalhos publicados, em jornais e revistas especializadas, como " A Dupla nacionalidade, no Direito Brasileiro", e muitos outros, principalmente, no campo do Direito Constitucional. Além disso, recebeu o troféu " Cecília Meireles ", no evento " Mulheres Notáveis", realizado, em Belo Horizonte, em 2004, o prêmio de " Maior Doação", na Corrida e Caminhada Contra o Câncer de Mama ( 2005 e 2006 ), e o prêmio " Solidariedade", pela efetiva colaboração, dada, para a construção do Hospital da Criança de Brasília "José de Alencar".
 
Aqui - a propósito da colaboração, dada pela Dra. Mirto Fraga, a várias iniciativas, em Brasília, de assistência social -, é preciso lembrar também o valoroso trabalho, em Uberaba,  de Aparecida Conceição Ferreira ( Dona Aparecida ), que, sozinha, contando apenas com doações, colhidas, por ela própria, nas ruas da cidade e, posteriormente, nas de São Paulo, construiu o Hospital do Pênfigo ( Fogo Selvagem ), em 1959.  Nascida em Igarapava, Dona Aparecida, quando chegou à cidade, com marido e filhos, foi trabalhar, como enfermeira, no setor de isolamento, da Santa Casa de Uberaba, que, em certo momento, teve de suspender, por ser difícil e dispendioso, o tratamento dos portadores da doença. Inconformada com o que via, Dona Aparecida levou todos os pacientes para a sua casa, iniciando, assim, a sua luta, pela criação do Hospital. Foi, mais ou menos por essa época, que, de forma providencial, Chico Xavier apareceu, na cidade e, impressionado com a abnegação de Dona Aparecida aos doentes, passou a ajudá-la, em sua fervorosa batalha.
 
Muito antes desse grande feito de Dona Aparecida, entretanto, ou mais precisamente, na década de trinta, a senhora Maria Modesto Cravo ( Dona Modesta ), nascida, na cidade, em 1899 , que teve formação católica, inspirada nas palavras do médium espírita Eurípedes Barsanulfo, de Sacramento, após o surgimento nela dos primeiros fenômenos mediúnicos, criou, em 1934, o Sanatório Espírita de Uberaba, cujo projeto recebeu mediunicamente. Em 1938, o Sanatório foi inaugurado, pelo presidente do Centro Espírita de Uberaba, o sanitarista Dr. Henrique von Krugger, tendo como diretor clínico, o Dr. Inácio Ferreira -, também de orientação espírita e, como psiquiatra, seguidor da linha de pensamento de Freud. Atualmente, o Sanatório Espírita passa por grandes dificuldades para continuar, prestando assistência aos portadores de doenças mentais. 
 
A História, infelizmente, não guardou os nomes das muitas enfermeiras, que, no século XIX, enfrentando inúmeras dificuldades, cuidaram dos soldados, doentes, feridos, participantes das forças militares, para a campanha de Mato Grosso, ao eclodir a Guerra do Paraguai, os quais chegaram  à cidade, em 18 de julho, de 1865, depois de uma viagem de quatro meses, vencendo distância de 93 léguas, desde Santos, no Estado de São Paulo. Essas enfermeiras merecem também, penso eu, terem, aqui, suas memórias reverenciadas. 
 
É no setor do jornalismo e das letras, contudo, que as mulheres importantes para a cultura de Uberaba são mais numerosas, de acordo, com a 
" Coletânea Biográfica de Escritores Uberabenses", organizada por Sonia Maria Rezende Paolinelli, publicada pela Sociedade Amigos da Biblioteca Pública Municipal " Bernardo Guimarães". Destaca-se, nesse sentido, o nome de Iná de Sousa, que, com um irmão, Nicanor de Sousa Junior, criou a famosa revista " Graça e Beleza", impulsionadora da vida social da cidade, nas décadas de quarenta e cinquenta. Suas crônicas foram reunidas no livro " Fragmentos ", o único, que publicou, em vida.
 
Iná de Sousa, que foi também diretora da Biblioteca Municipal " Bernardo Guimarães", empenhou-se, ao lado de Eleusa Fonseca, na frustrada campanha para construção do Teatro de Alumínio, sucedendo-a, depois, na presidência do Núcleo Artístico e Cultural da Juventude - NACJ. Idealista, Iná - em companhia da vice-presidente da entidade, Mirthes Bruno, também grande artesã  - não se furtou, em me ajudar, na tarefa de adaptar um barracão da Prefeitura, localizado na Rua 13 de Maio, cedido ao NACJ, sob a forma de comodato, pela primeira administração de Arthur de Mello Teixeira ( 1955-1959 ), num Teatro de Bolso, de 120 lugares, inaugurado, em maio, de 1958, com a montagem da peça   " Cândida", de George Bernard Shaw, sob minha direção. A criação do Teatro de Bolso foi o tema escolhido por Luíza Ritz Bertocco, natural de São Paulo, para o seu excelente trabalho de graduação, em Letras, pela Universidade do Triângulo Mineiro, o qual, lamentavelmente, necessitando de patrocínio, permanece inédito!...
 
Ainda, no setor do jornalismo, as figuras femininas, que despontam, com base em informações colhidas, no livro " Periódicos Culturais de Uberaba ", de Guido Bilharinho, são: Maria Aparecida Manzan, criadora, no âmbito do Arquivo Público de Uberaba, da revista " Documento e História" ( 1989 ), do boletim informativo " Acervo Cultural" ( 1990 ),  da revista " Memória Viva " ( 1990 ) e " Cadernos de Folclore" ( 1993 ), que surgiu, com uma edição especial, dedicada às Folias de Reis, a qual revelou outra pesquisadora, de mérito, Sonia Maria Fontoura; professora e escritora Vânia Maria Resende, responsável pela série, de sete livros, sob o título " Antologia Literária Infanto-juvenil  Vinicius de Moraes ", com textos de crianças e jovens, do Estado de Minas Gerais, e pela editoria do jornal " Nova Dimensão", da Secretaria Municipal de Educação; Lenice Sivieri Varanda, editora da revista " Reflexos";  Márcia Maldonado, editora da revista " Voila ".
 
Devem ser citadas ainda: Ellen Gomes, editora da revista " Revista da Zito"; Marisa Borges de Brito, editora de " Ponto de Encontro"; Eva Reis, poeta, autora do livro " A Fiandeira", e editora do jornal  " A Trova Na Trova"; Adriana Helena Soares, editora de " Cidade Atual " ; Mariana do Espírito Santo, editora do jornal literário " MUH!";  e Lídia Prata Ciabotti, presidente do Grupo JM, que edita, há mais de 45 anos, o " Jornal da Manhã", cujo acervo foi adquirido, recentemente, pelo Arquivo Público Municipal, o qual já havia adquirido o do " Lavoura e Comércio " ( 1899-2003 ). Ambas aquisições se deram na gestão de Marta Zednik de Casanova, também autora do livro " Biblioteca Pública Municipal " Bernardo Guimarães" - Evolução Histórica: 1909 - 2009 - Um Século de Cultura ", lançado nas comemorações do centenário da Biblioteca.
 
Na " Coletânea Biográfica de Escritores Uberabenses ", organização de Sonia Maria Rezende Paolinelli, figuram ainda as seguintes escritoras, citadas aqui, com algumas de suas obras: Ana Maria Leocádio ( " Eu e a Paz", poesia ); as irmãs, gêmeas, Ani e Iná ( " Gêmeos, Semelhança Oculta", " Viagem Cósmica" ) ; Brunhrild Maria Fátima de Souza ( " Ovo de Gente" e " Engenharia, Arte de Construir Vidas " ); Consuelo Pereira Rezende do Nascimento 
( " Mundo Esse ", " Em Tempo", " Narco-Íris ", poesias ); Dea Rodrigues da Cunha Campos Rocha ( " Os Comes e Bebes, nos Velórios das Gerais, e Outras Histórias " ); Delia Maria Prata Ferreira ( " Do Silva ao Prata" ); Dirce Miziara ( " São Paulo aos Coríntios, na Passagem do Século" ); Irmã Domitila Ribeiro Borges ( " Fonte Selada" , " Flor Intocada", " O Santo Que Me Encantou " ); Eliane Mendonça Marquez de Resende ( " Uberaba, Uma Trajetória Sócio-Econômica 1811-1940",  " Arquivos Cartoriais " , " Guia Curricular de História" e " ABCZ: História e Histórias"; Eliete Rodrigues Pereira
 ( " O Poder do Sexo" ); Elza Herminia Sabino Mendes ( " Retalhos de Vidas" , " Porto Alegre: Essa Doce Gaúcha" , " Tributo de uma Vênus " ).
 
São citadas ainda, na " Coletânea ": Eunice Puhler ( " Menino do Mar ", " Menino de Cristal ", " Menino do Cerrado" , " Menina Rosa ", " Menina dos Olhos de Deus ", " Coração do Cerrado ", " As Mil e Uma Ruas Por Onde Andou... Minha Infância ", e outros ) ; Eva Reis ( " Fiandeira " , " Cantares: Trovas de Outono "; Gina Mara Silva ( " Sementes de Amor " ); Leila Venceslau Rodrigues da Cunha ( " Improvisos " ) ; Lourdes Marques de Almeida 
( " Cantando Vivências " , " Quando eu Crescer " ); Lusa Almeida Soares de Andrade ( " Barracão de Barro: Cerâmicas" ) ; Magda Vilas-Boas 
( " Relaxamento Com Crianças", " Terceira Idade: Uma Experiência de Amor " , " Crianciranda: Terapia Corporal com Crianças", " Atraindo Realizações " e outros ) ; Márcia Queiroz Silva Baccelli ( " A Porta de Céu ", " Além do Arco-Iris ", " O Violinista ", " A Estrelinha Beatriz" , " Chico Xavier Para Sempre",  " O Mineiro do Século " , e outros ); Maria Abadia Enes Lombardi ( " Mel, a Abelha " ); Maria Ângela Cusinato ( "Sentimentos Escritos nas Estrelas", 
" Recados de uma Luz" ).
 
Na referida " Coletânea ", destacam-se também: Irmã Maria Antônia de Alencar ( " Opúsculo Uma Alma Celeste", As Flores do Meu Jardim ", " No Claustro, Com Meus Amigos ", " Meu Canto Ao Por do Sol " , " Últimas Flores " , e outros, inclusive CDs de Poesia; Maria Antonieta Borges Lopes 
( " ABCZ - 50 Anos de História e Histórias ",  " ABCZ : História e Histórias ", " Dominicanas: Cem Anos de Missão no Brasil ", e outros ) ; Maria Regina Basílio Teodoro dos Santos ( "Uma Palavra para Você que está..." ); Mariane Bellocchio Fontoura Borges ( " Família: Amora Doce & Limão Galego" ) ; Selma Amuí ( " Professor: Profissão ou Sina?"  ) ; Suely Braz Costa ( " Cada Pessoa é uma Empresa ", " O Ministério da Família ", " Educador", " Minha Viagem à Índia ", " Marketing Pessoal: Teoria e Prática ", e outros ); Teresa Maria Machado Borges ( " Criança em Idade Pré-escolar Escolar, " Ensinando a Ler, sem Silabar: Alternativas Metodológicas " , " Alfabetização Matemática - Do Diagnóstico à Intervenção" ); Teresinha Caubi de Oliveira ( " Sinfonia de Quintal ", " Boa Noite, Dona Lua ", " Fuga do Pantanal", " Monólogo da Natureza ", " Encontro das Aves", " Com a Palavra, os Mamíferos ", e outros ), e Terezinha Hueb de Menezes ( " Tempesfera ", " Temas do Cotidiano ", " Quantas Saudades do  Colégio Vou Levar ", e " Murilo Pacheco de Menezes, o Homem, e seu Legado ).
 
A doçaria, que hoje floresce, na cidade, começou a se desenvolver, plenamente, ao final da década de 40, do século passado, quando duas doceiras, de escol, entre outras, exercendo suas atividades, no âmbito doméstico, simplesmente, se destacaram, por suas criações, tidas, então, como originais, mas muito apreciadas, pela sociedade uberabense.
 
A primeira delas, foi Dona Diva Lemos de Abreu - mãe de uma Miss Uberaba, Maria Josina -, que lançou, atendendo apenas a encomendas, em embalagens de metal ( alumínio ou latão ) , um doce de leite, inigualável, com textura bastante semelhante à do mel, meio puxento, que se mantinha, no céu da boca, por algum tempo, e de um sabor extraordinário, lembrando, um pouco, ao de um refinado chocolate, como o que é produzido, na França, na Bélgica, e, na Suíça. Lamentavelmente, o doce de leite, hoje produzido, nos dias que correm, em larga escala, na cidade, nada, ou quase nada, tem a ver com o de Dona Diva Lemos de Abreu. Era verdadeiramente sublime!...
 
A segunda, foi Dona Acelina Novaes Magalhães, que, entre outros tipos de doces, finíssimos, por ela produzidos, também por encomendas, para festas, recuperou a receita de um manjar, a Siricaia, de origem indiana, trazida ao Brasil, pelos portugueses, no período colonial ( 1638 ). A Siricaia é uma espécie de creme ( ou manjar ), feito à base de leite, açúcar, ovos e raspas de casca de limão. Na Índia, acrescenta-se também fruta-de-conde.
 
As versões de receitas da Siricaia, que derivam da original, têm sempre um ponto em comum: o leite é fervido,  antes de serem acrescentados os demais ingredientes. A receita vai ao forno, em banho-maria. No Brasil, segundo Câmara Cascudo, existem duas versões, diferentes - a da Bahia, e a de Pelotas, no Rio Grande do Sul, que, segundo ele, é a mais autêntica. Mas, de uma forma geral, não se perpetuou, entre nós, o gosto pela Siricaia, como se perpetua, até hoje, em Portugal.
 
Na época, a Siricaia, de Dona Acelina Magalhães, era muito servida, e apreciada, por exemplo, nas tertúlias literárias, que estavam em alta, com apresentações, em residências familiares, de cantoras e de declamadoras. Foi nessas tertúlias, por sinal, que apareceu Altiva Fonseca, declamadora dos poemas de Olavo Bilac, e de outros poetas, em voga, na época, que, por ser possuidora de timbre de voz bastante semelhante ao da rádio-atriz, Ísis de Oliveira, da Rádio Nacional, do Rio de Janeiro - de muito sucesso, então, como intérprete da novela " O Direito de Nascer ", do cubano Felix Cañet -, logo foi contratada, pela PRE-5, para ser a primeira locutora uberabense. 
 
Altiva era irmã do polêmico advogado Pelópidas Fonseca, e tia de Eleusa Fonseca, já mencionada acima. Outras locutoras, que se seguiram, para fazerem história, na emissora, da família Jardim, foram: Iara Lins, que prosseguiu, na carreira, em São Paulo, primeiro, atuando, como  locutora, na Rádio Tupi, depois, mais tarde, como atriz, nas novelas, transmitidas pela TV- Tupi; Marina Márquez e Lídia Varanda, que, como também foi dito acima, integrou o Departamento de Teatro, do Núcleo Artístico e Cultural da Juventude, inesquecível intérprete da senhora Frola, personagem central da peça " Assim é, se lhe Parece", de Luigi Pirandello.
 
O leitor deste simples relato, compreenderá, finalmente, como assim espero, que, nele, procurei demonstrar, que os conceitos de cultura, principalmente, em nosso país, são mutáveis, pois se tornam, através dos tempos, ultrapassados, antiquados, ou obsoletos, como, por exemplo, os  casos lembrados aqui dos desfiles de elegância feminina, antes das sessões de cinema, das tertúlias literárias, dos bailes carnavalescos, do gosto pela Siricaia, etc. Tudo muda, com o tempo. Como voraz absorvedor de culturas de outros povos, o Brasil, facilmente, despreza as suas culturas próprias, tradicionais.
 
As pessoas, porém, que vivenciam  ( ou as que vivenciaram ) a sua cultura própria, sob seus variáveis aspetos, permanecem. Eternizam-se. É esse o caso das mulheres importantes para a cultura de Uberaba, aqui lembradas, que, cada uma, à sua maneira, ou especialidade, oferece ( ou ofereceu ) sua valorosa contribuição ao desenvolvimento de nossa cidade. Deve haver muitas outras, que a mim, involuntariamente, escaparam de serem citadas, perante as quais, agora, me penitencio. A todas, porém, fica registrada a minha reverência, o meu reconhecimento, neste ligeiro esboço de documento histórico que, no futuro, merecerá, sem dúvida, não só ser revisto, como desenvolvido, e ampliado, até eternamente!... 

 

REYNALDO DOMINGOS FERREIRA
 

Jornalismo com ética e solidariedade.