Mães jornalistas são
mulheres esgotadas pela sobrecarga de
trabalho na pandemia
No Dia Internacional da
Igualdade Feminina (26/08), FENAJ
divulga dados de pesquisa da Comissão
Nacional de Mulheres e materializa
diagnóstico das condições de trabalho em
home office das jornalistas que são mães
no contexto da pandemia
A pesquisa sobre
condições de trabalho durante a pandemia
das mulheres jornalistas que são mães,
coordenada pela Comissão Nacional de
Mulheres da Federação Nacional dos
Jornalistas (FENAJ), evidencia em
números e relatos um cenário vivenciado
de maneira generalizada na categoria: o
aumento de carga horária e o fato de
estarem sempre disponíveis para o
trabalho como uma condição do home
office, concentração do trabalho
doméstico e do cuidado com os filhos.
Disponibilizada no
período de 7 a 17 de agosto de 2020, a
pesquisa “Mães jornalistas e o contexto
da pandemia”, composta por 26 perguntas
de múltipla escolha, questões abertas
complementares e espaço para avaliação,
foi estruturada em quatro seções,
contemplando questões sobre o perfil das
trabalhadoras jornalistas, as condições
de trabalho, a situação familiar dessas
mulheres e a opinião delas sobre a volta
às aulas presenciais dos filhos/as.
“O formato de pesquisa
foi construído coletivamente por
mulheres jornalistas de territórios das
cinco regiões do país, por mães, por
pesquisadoras, por profissionais que
atuam nas redações, por dirigentes
sindicais, por jornalistas que não são
mães, por uma pluralidade de mulheres
que considera que o movimento sindical
deve pautar as lutas por melhores
condições de trabalho a partir do
entendimento das transversalidades das
questões de gênero, raça e diversidade”,
explica Samira de Castro, segunda
vice-presidenta da FENAJ e integrante da
Comissão de Mulheres.
Respondida por 629
profissionais jornalistas de todos os
estados do Brasil, o mapeamento
demonstra que, ainda que compartilhem
cuidados, estas mulheres se sentem
sobrecarregadas com aulas online,
alimentação e cuidados da casa, ao mesmo
tempo que precisam conciliar o trabalho home
office ou presencial.
Resultados sistematizados
A principal função
exercida dentro do jornalismo pelas
mulheres que são mães é de Assessora de
Imprensa (40,06%), seguida da atuação
como repórter (15,9%). O regime de
trabalho da maioria está sendo feito em home
office (59,78%), seguido pelas
profissionais que estão em regime misto,
ou seja, mesclando trabalho remoto com
atividades presenciais.
Quanto à questão
salarial, 57,82% não tiveram alterações
no salário e na jornada de trabalho
durante a pandemia e outras 16,4% foram
impactadas pela legislação que instituiu
o Programa Emergencial de Manutenção do
Emprego e da Renda, com base na Lei Nº
14.020/2020 (oriunda da Medida
Provisória 936), seja com redução
salarial ou suspensão do contrato de
trabalho.
Das mães jornalistas,
7,6% estão desempregadas e 15,1% das
participantes precisaram solicitar o
benefício emergencial, sendo que 5,56%
receberam o valor de R$ 600, outras
4,13% o valor de R$ 1.200, destinado às
mães que são as únicas responsáveis
pelos filhos/as ou são chefes de família
e 5,41% solicitaram, mas não receberam.
Para 63,4% dessas
mulheres, a responsabilidade com a
criança é compartilhada com o pai. Mas a
segunda maior ocorrência é de mulheres
jornalistas que são mães solo e também
as únicas responsáveis pelos filhos
(22,4%). Nesse cenário, ainda que a
maioria tenha declarado que compartilha
cuidados e responsabilidades sobre os
filhos com o pai, 85,9% das mães
assinalaram que se sentem
sobrecarregadas na pandemia.
Outras 26,7% dessas
mulheres são responsáveis pelos cuidados
de outras pessoas. Em questão aberta, as
jornalistas relatam que essa situação
inclui majoritariamente familiares
idosos que precisam de apoio durante a
pandemia.
De acordo com Paula Zarth
Padilha, diretora executiva da FENAJ e
integrante da equipe de sistematização
do levantamento, a pesquisa aponta para
um esgotamento destas jornalistas e
também ilustra o quanto a atividade de
cuidado é quase que exclusiva das
mulheres. “Ressaltando que entre as mães
jornalistas que contam com rede de
apoio, a maioria das pessoas com quem
dividem os cuidados com relação aos
filhos é do gênero feminino (53
situações contra 21 casos em que o apoio
vem de um homem que não é o pai) ”,
pontua.
Em questão aberta
relacionada à sobrecarga de trabalho, os
relatos abordam a dificuldade de atender
os filhos durante aulas remotas; de
conciliar esta e outras
responsabilidades com o trabalho
jornalístico; sobre como são cobradas
por desempenho no teletrabalho sem ter
qualquer empatia por parte dos
superiores hierárquicos; e ainda, a
respeito da sensação de estarem o tempo
todo tendo que se colocar à disposição
para o trabalho. E quem continua
exercendo o trabalho presencial ou misto
não tem qualquer suporte para a situação
das aulas estarem suspensas e pelo risco
de não estar em isolamento.
Volta às aulas
A maioria das mães
jornalistas (82,3%) têm filhos que
cursam até o 5º ano do ensino
fundamental, ou seja, desde bebês até
crianças com 10 ou 11 anos de idade, em
fase de intenso aprendizado. Ainda que
apenas 21,5% das crianças/filhos em
idade escolar não estejam em aula remota
e que as mães descrevam relatos de
esgotamento por ter que assumir essa
dimensão do acompanhamento do ensino em
casa, 88,4% são contra o retorno das
aulas nos próximos meses.
Ao menos 47,1% das mães
não vão permitir que os filhos retornem
às aulas presenciais em 2020, e outras
18,6% cogitam retirar os filhos da
escola caso a frequência presencial
venha a ser obrigatória. “Essa questão
situa as jornalistas no debate geral
sobre a educação no contexto da crise de
Covid-19, fazendo coro a trabalhadoras
de outras categorias que já se
pronunciaram sobre os riscos de retorno
de crianças, adolescentes e jovens aos
espaços educacionais”, aponta Aline de
Oliveira Rios, integrante da Comissão de
Mulheres pelo Sindicato dos Jornalistas
do Paraná (Sindijor/PR) e uma das
responsáveis pela sistematização dos
dados.
Para além da escuta
Conforme relatório e
avaliação da Comissão Nacional de
Mulheres da FENAJ, uma das principais
questões evidenciadas pela pesquisa é a
maneira como a invisibilização da
sobrecarga de gênero penaliza as
mulheres, abstendo-se de ser objeto de
políticas públicas e de ações práticas
de enfrentamento.
Rose Dayanne Santana
Nogueira, diretora da FENAJ, integrante
da Comissão de Mulheres pelo Sindicato
dos Jornalistas Profissionais do
Tocantins (Sindjor/TO) e uma das
responsáveis pela sistematização dos
dados, afirma que outras questões também
refletem que as condições de trabalho
modificadas pela pandemia escancaram a
necessidade de regulamentação do home
office, de equidade no ambiente de
trabalho e de reflexão sobre os
rearranjos familiares durante a
pandemia, em que o isolamento é um dos
fatores que tem deixado as mães à beira
da exaustão.
Com esse caráter de
denúncia da sobrecarga, a pesquisa
mapeia uma série de abusos que têm
ocorrido nos ambientes de trabalho no
Brasil, com jornadas abusivas, excesso
de trabalho, aumento da cobrança por
parte dos superiores (mesmo entre
aquelas que tiveram redução de salários
e jornada), acúmulo de funções e as
frequentes cobranças para dar conta de
prazos, de plantões (incluindo quem está
em teletrabalho) e de inúmeras reuniões,
além daquelas que estão sendo obrigadas
a participar de cursos – sem qualquer
empatia com o fato da existência do
cuidado com os filhos e dos afazeres
domésticos.
Diante de tantas
questões, a Comissão Nacional de
Mulheres da FENAJ irá encaminhar os
resultados da pesquisa aos Sindicatos
filiados para que possam orientar
possíveis medidas que tenham também como
objeto a preocupação com as questões de
gênero no trabalho.
A pesquisa também será
enviada a órgãos de proteção ao trabalho
como um esforço para chamar a atenção
para a realidade das mulheres
trabalhadoras, que não é exclusiva, mas
se acentua, no contexto da pandemia,
demonstradas nesse recorte com as mães
jornalistas.
Acesse
aqui o relatório da pesquisa