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O Milagre - LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO
A Finlândia era um país pobre até a metade do
Séc. XX. Somente na década de 60 abriu a sua
primeira estrada. E na de 70 suas escolas. Hoje,
somente cinquenta anos depois, o país é o quarto
em competitividade mundial, o terceiro menos
corrupto, o quarto no índice de Justiça e na
qualidade de sua democracia, sendo um dos países
mais igualitários do mundo. E com um dos maiores
índices de felicidade.
Qual foi a alavanca, o milagre dessa mudança
fenomenal? Segundo Claudia Wallin em um valioso
vídeo, “Vamos fazer no Brasil? ” isso somente
foi possível pela decisão histórica do
Parlamento finlandês, tornando a educação de
qualidade extensiva a todas as crianças,
independentemente do nível econômico de sua
família. Ninguém precisaria pagar. Como afirmou
a diretora de uma escola a inclusão social
permitiu que filhos de empresários e de
operários estudassem no mesmo ambiente escolar.
Em segundo lugar, a carreira de magistério foi
altamente valorizada, com salários dignos
(metade do que ganha um parlamentar) e processo
intensivo de aperfeiçoamento dos professores, o
mestrado sendo condição básica para exercer o
ofício. Valorizado o professor, respeitado, a
carreira do magistério passou a ser mais
valorizada do que muitas outras como medicina,
por exemplo.
Uma terceira condição que operou o milagre da
transformação finlandesa foi o “pensar fora da
caixa”. Menos número de aulas, menos provas,
relaxar mais e estímulo para que os alunos
pensem por si mesmos e tentem inovar. Esse tipo
de educação se tornou um dos mais celebrados do
mundo e projetou os indicadores da economia
finlandesa ao topo mundial.
A quarta condição do milagre foi a constatação
de que quem tem fome, medo, não tem proteção de
saúde e moradia, não tem cuidados, não pode
aprender. Assim, com os impostos, foi mantido o
Estado de Bem-Estar Social, proporcionando às
crianças as condições necessárias para seu
desenvolvimento. Refeições fartas, em sala um
professor assistente dando atenção individual a
cada criança em suas dificuldades específicas.
Pedagogos, médicos e dentistas atendem as
crianças nas escolas. “Vamos fazer no Brasil? ”
pergunta Cláudia Wallin.
Sem dúvida, cada município brasileiro poderia
desenvolver uma escola de qualidade e condições
sociais que apoiassem as crianças: saúde,
moradia, cuidados específicos. Se.... os
políticos não vivessem do nosso alfabetismo, se
não tivéssemos corrupção em quase metade dos
municípios pesquisados, se o número de
municípios estivesse de acordo com sua
capacidade de desenvolvimento independente e não
fossem criados para servir interesses
eleitoreiros ultrajantes. Se muitos de nossos
representantes fossem mais preparados e
dedicados à sua função com honestidade. Se as
Prefeituras não estivessem abarrotadas de gente,
enquanto a população sofre sem serviços públicos
ou atendimento precário. Se houvesse constante
avaliação anual dos índices de aprendizagem dos
municípios e recursos federais somente fossem
liberados, para municípios que conseguissem
alcançar esses índices. Se o FUNDEB funcionasse.
“Vamos fazer no Brasil? ” Conseguiremos, Claúdia?
Porque certamente todo mundo sabe ou desconfia
do que deve fazer em termos de educação. E mais,
todo o tempo e esforço na luta das minorias,
negros, mulheres entre outras, poderia ser
dirigida a uma educação de qualidade. Quando
encontraríamos a solução para a maioria das
questões. Há tempos você escreveu um livro: “Um
país sem excelências e mordomias. ” No meu
reduzido espaço de fala há muito tempo me dedico
a escrevinhar sobre o tema: uma das formas de
expressão da desigualdade social e da nossa
pretensa democracia. Uma cultura comprometida
com os valores do enriquecimento ilícito e das
mordomias e privilégios como símbolos de poder.
Extorquindo um Estado falido. Como vamos fazer
no Brasil com esse nível de comprometimento e
educação?
LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO <luizaccardoso@gmail.com>
5 de set. de 2020 |
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