|
|
|
|
|
|
Boa noite e boa sorte - Comentário de Theresa
Catharina de Góes Campos
Theresa Catharina, jornalista, escritora e
professora universitária. É editora do Arte &
Cultura News < www.arteculturanews.com > e
Notícias Culturais < www.noticiasculturais.com >
Usando estilo narrativo e formato documental, o
filme atualíssimo, embora não-comercial, "Boa
noite e boa sorte" registra, com elevado senso
de responsabilidade, um momento histórico que
merece ser estudado, em todas as suas
implicações, no contexto de sua época e nos dias
de hoje, por abordar as ameaças aos princípios
de liberdade pessoal, quanto ao direito de
pensar e ter idéias próprias (mesmo divergentes
da maioria ou de grupos agressivos), fundamentos
filosóficos, democráticos e universais, que
devem nortear uma civilização.
"Um filme espantoso, do começo ao fim." (New
York Observer)
No cartaz de divulgação, lê-se uma frase
audaciosa:
"Existe uma maneira de mudar o
mundo...Televisão."
www.goodnightandgoodluck.com
No Festival de Veneza 2005, George Clooney e
Grant Heslov (co- roteiristas) foram agraciados
com o prêmio de Melhor Roteiro.
No mesmo Festival, "Boa noite e boa sorte"
conquistou o Fipresci Prize - Prêmio
Internacional de Crítica.
"Melhor filme do ano." (Daily News - San
Francisco - The Examiner - US Today)
" Uma composição apaixonada." Com verdade e
responsabilidade...assista..." (The New York
Times)
"Excelente" (Chicago Sun Times)
Quero também registrar aqui, com entusiasmo, a
minha recomendação e opinião sobre "Boa noite e
boa sorte"-(Good night,and good luck-EUA, 2005
-p/b-de George Clooney-90 min.), filme de
abertura do 43º Festival de Cinema de Nova York,
baseado em fatos reais.
Diretor cinematográfico pela segunda vez,
Clooney volta igualmente aos bastidores da
televisão. Filho do jornalista Nick Clooney -que
escreve para o The Cincinnati Post -conseguiu
realizar, com
"Boa noite e boa sorte" , um admirável registro
histórico do jornalismo. Com preocupações
éticas, num clima de tensão e suspense desde as
primeiras cenas até os momentos finais.
Contudo, seu olhar é profundo, abrangente, muito
além dos arquivos e das aparências, examinando
sem medo , nem pudor, a década de 50 nos EUA,
marcada pelos confrontos onipresentes do senador
Joseph McCarthy, ameaçando e desafiando a
liberdade de expressão e o papel informativo e
formador da mídia.
Seu filme, esclarecedor, pronuncia-se como um
libelo dramático em favor das instituições
democráticas.
Como prever o que poderia acontecer com a
própria vida dos personagens , depois de
noticiarem o drama de outros cidadãos? Essa
incerteza, todos os envolvidos sentiam.
A sensação de insegurança reflete-se na conversa
do casal de jornalistas, na cama, sobre os
acontecimentos surpreendentes e as possíveis
conseqüências; o pressentimento quanto a perder
o emprego, como um fantasma a lhes rondar a
privacidade, as horas eventuais de descanso.
Edward R. Murrow, jornalista famoso por seu
caráter e sua atuação íntegra no rádio e na
tevê, é o protagonista da história,
brilhantemente interpretado por David Strathairn.
Nas décadas de 30 e 40, Murrow também se
notabilizou por combater o fascismo e o nazismo.
No elenco, também se destacam: Patricia Clarkson,
George Clooney, Jeff Daniels, Robert Downey Jr.,
Frank Langella.
Fiquei impressionada com as qualidades de
realização de "Boa noite e boa sorte" (produção,
pesquisa, direção, elenco, interpretação,
roteiro, diálogos, edição, figurinos, maquiagem,
reconstituição de época, cenografia e trilha
sonora).
E, sobretudo, absolutamente impressionada com a
seriedade da obra e a sua importância como
cinema de "revelação", protesto e denúncia, aos
que desconhecem os fatos ou negligentemente se
permitiram esquecer esses acontecimentos dignos
de contínua reflexão.
As situações e os temas não-ficionais de "Boa
noite e boa sorte" constituem um cenário de
conflitos historicamente mascarados, com alguns
aspectos importantes quase invisíveis,
inaudíveis, fora do ambiente em que se
movimentam os personagens reais. Um clima
sombrio no contexto do período pós-guerra,
assinalado pelas suspeitas da chamada "guerra
fria".
Cinema que cumpre a sua missão como instrumento
de informação e denúncia insistente, para que
todos aprendamos com a verdade escondida ou
disfarçada, nos círculos governamentais, nas
chefias dos meios de comunicação, entre as
autoridades nacionais. História omitida, abafada
e arquivada por motivos indefensáveis, apesar de
seu potencial para repetição. Vulcão onde apenas
se colocou uma pedra, na vã tentativa de impedir
futuras erupções.
Já fui à pré-estréia de "Boa-noite e boa sorte"
preparada para apreciar e aplaudir, entretanto,
o filme de George Clooney superou as minhas
elevadas expectativas.
É de uma coragem surpreendente, que nos comove
até visceralmente, no mais íntimo de nós mesmos,
com sinceridade e sobriedade, com ousadia
incomparável, em sua forma despojada e seu
conteúdo manifesto. Sim, uma ousadia
surpreendente, se considerarmos que o diretor,
co-roteirista e intérprete - George Clooney,
cidadão estadunidense, atua no cinema e na tv de
seu país.
Expõe com objetividade e clareza os pontos
fracos da política de segurança de uma nação
aparentemente forte. E de sua sociedade,
fundamentada em anti-valores que nela seriam
inexistentes, mas de fato existem! São forças de
pressão, atuantes em todas as esferas da
realidade nacional.
Demonstra facilmente como a tv pode ser um
instrumento de embuste e ciladas para a opinião
pública. Conseguir e agradar aos patrocinadores,
aumentar os lucros... orientam as decisões. O
público é apenas o mercado consumidor. Não se
trata de formar cidadãos, e sim, de aumentar os
lucros, de vender produtos, a qualquer preço.
Eis o caminho, também , para a covardia diante
dos poderosos, estejam esses donos do poder onde
estiverem.
E abre as portas dos estúdios, gabinetes e
redações, para que todos os cidadãos vejam e
ouçam como o desrespeito à verdade e aos
direitos inalienáveis da pessoa humana ocorre,
inclusive, na prática do jornalismo, que deveria
ser o seu baluarte.
No entanto, mesmo nesse deserto moral,
encontramos pessoas corajosas, íntegras e
conscientes.
São profissionais que não enganam, nem se deixam
enganar. Cidadãos cuja proposta ética de vida é
conscientizar, informar , educar o público, e
não, satisfazer o mercado simplesmente, e não,
divertir sem compromissos, para que esse público
se torne cego à verdade que passa, perseguida
como criminosa...
Mais, não consigo falar, neste momento, sobre
"Boa noite e boa sorte"...que, como cinema,
assumiu esse dever de informar sem hesitação.
Como também não consegui falar, nem me levantar
de imediato, para sair da sala de exibição, por
me sentir tão positivamente perturbada, ao
término da sessão. |
|
|
|