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Perdão, ME PERDOE O POETA!
Para Octavio Paz, as palavras são como muralhas
ondulantes e ásperas - podem se fazer luz para
quem se arrisca. E ao falar na força de
transformação que elas possuem, ele as compara a
fênix, a romã e a espiga de eleusinia. E nos
leva a contactar os símbolos da imortalidade.
Assim como o sol, que na mitologia grega morre à
noite, para renascer sempre pela manhã. Os
mistérios, a abundância, a fecundidade. De
lançar as sementes e fazer brotar a colheita, em
uma espécie de morte e ressurreição.
Na verdade, é da poesia que fala o poeta. Da
importância da revelação poética. Ele diz:
apesar das variações históricas que o poema,
encarnação do poético, possa revelar, tudo isso
perde para o homem. Pois é o homem que percebe a
criação. Aquele que cria. E mais, quanto ao que
cria, esclarece, “se inicia como silêncio,
esterilidade e seca. É uma carência e uma sede,
antes de ser plenitude e um acordo: e depois é
uma carência ainda maior.” Na verdade, continua
o poeta, a inspiração vem do abismo,
transformando as palavras em forças e
realidades. E o poético consiste em nomear e é
uma possibilidade. Uma contínua criação.
No entanto, é ao falar da relação entre o poeta
e os leitores que suas palavras tocam
profundamente meu coração. Afirma que o poeta
fica sozinho e os leitores irão recriar o poema.
O leitor percebe a imagem, entrega-se ao fluir
das palavras, vê o abismo e se precipita. E
esclarece: ao cair desprende-se de si mesmo para
internar-se em “outro si mesmo”. Até então
desconhecido ou ignorado. “Recitar é aspirar e
respirar o mundo”. A poesia nos permite visitar
outro tempo, que não é o convencional. É como
dar um “salto” para outra margem, onde
transfiguramos a história, transformamos,
construímos o instante, o aqui e o agora.
Provavelmente, como nos explicam “Os mistérios
Eleúsios”, trata-se da libertação que, para
Octávio, é obra do poema. O homem como
possibilidade, uma relação de encantamento, de
inspiração libertária, como a representação
simbólica da alma, “de sua descida na matéria,
de seus sofrimentos nas trevas, do esquecimento
e depois sua ascensão à vida.” Como diz Vinicius
de Oliveira Prado em seu trabalho “Octávio Paz e
a compreensão do instante”: “A existência é a
fenda e abertura em que o homem se encontra de
antemão lançado, na tensão entre: superfície e
profundidade, claro e escuro, descoberto e
encoberto, o sim e o não”.
Me perdoe o poeta! Mas é a música que me faz
descer até camadas mais profundas, me arriscar
em abismos, encontrar com o tempo não
convencional, experimentar os claros escuros da
minha frágil humanidade,
a esterilidade e a seca e tentar ressurgir.
Música que, frequentemente, parece me levar a
caminhar em meio às dores da vida, mas de certa
forma, liberta e transformada. Ela me transporta
a mundos desconhecidos, me surpreende com meu
outro Eu a esperar na esquina. Aquele
desconhecido ou ignorado. Sim, é inspiração
libertária este som que me descobre novas
paragens, angústias reconhecidas, culpas e
nostalgias. E no contato com tamanha beleza,
renascer depois, mesmo sabendo que os abismos
estão sempre por aí. Como o tempo fugidio e a
finitude de tudo. Assim me encontrei ao ouvir
Eva Cassidy com sua voz e interpretação
belíssimas, cantando uma versão excepcional de
“Over the Rainbow”.
“Um dia eu farei um pedido a uma estrela/
acordar em um lugar onde as nuvens estão bem
atrás de mim/ onde os problemas derretem como
balas de limão/ Bem acima do topo de uma
chaminé, / é lá que você me encontrará/ Em algum
lugar além do arco íris.” Obrigada meu caçula,
você me deu um lindo presente!
LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO
7/2021 |
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