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Data: |
2 Feb 2006 07:55:02 -0000 |
Assunto: |
Cultura/Cinema: Boa noite e boa
sorte - Comentário de Theresa
Catharina |
Boa noite e boa sorte - Comentário de
Theresa Catharina
Usando estilo narrativo e formato
documental, o filme atualíssimo, embora
não-comercial, "Boa noite e boa sorte"
registra, com elevado senso de
responsabilidade, um momento histórico que
merece ser estudado, em todas as suas
implicações, no contexto de sua época e nos
dias de hoje, por abordar as ameaças aos
princípios de liberdade pessoal, quanto ao
direito de pensar e ter idéias próprias
(mesmo divergentes da maioria ou de grupos
agressivos), fundamentos filosóficos,
democráticos e universais, que devem nortear
uma civilização.
"Um filme espantoso, do começo ao fim." (New
York Observer)
No cartaz de divulgação, lê-se uma frase
audaciosa:
"Existe uma maneira de mudar o
mundo...Televisão."
www.goodnightandgoodluck.com
No Festival de Veneza 2005, George Clooney e
Grant Heslov (co- roteiristas) foram
agraciados com o prêmio de Melhor Roteiro.
No mesmo Festival, "Boa noite e boa sorte"
conquistou o Fipresci Prize - Prêmio
Internacional de Crítica.
"Melhor filme do ano." (Daily News - San
Francisco - The Examiner - US Today)
" Uma composição apaixonada." Com verdade e
responsabilidade...assista..." (The New York
Times)
"Excelente" (Chicago Sun Times)
Quero também registrar aqui, com entusiasmo,
a minha recomendação e opinião sobre "Boa
noite e boa sorte"-(Good night,and good
luck-EUA, 2005 -p/b-de George Clooney-90
min.), filme de abertura do 43º Festival de
Cinema de Nova York, baseado em fatos reais.
Diretor cinematográfico pela segunda vez,
Clooney volta igualmente aos bastidores da
televisão. Filho do jornalista Nick Clooney
-que escreve para o The Cincinnati Post
-conseguiu realizar, com
"Boa noite e boa sorte" , um admirável
registro histórico do jornalismo. Com
preocupações éticas, num clima de tensão e
suspense desde as primeiras cenas até os
momentos finais.
Contudo, seu olhar é profundo, abrangente,
muito além dos arquivos e das aparências,
examinando sem medo , nem pudor, a década de
50 nos EUA, marcada pelos confrontos
onipresentes do senador Joseph McCarthy,
ameaçando e desafiando a liberdade de
expressão e o papel informativo e formador
da mídia.
Seu filme, esclarecedor, pronuncia-se como
um libelo dramático em favor das
instituições democráticas.
Como prever o que poderia acontecer com a
própria vida dos personagens , depois de
noticiarem o drama de outros cidadãos? Essa
incerteza, todos os envolvidos sentiam.
A sensação de insegurança reflete-se na
conversa do casal de jornalistas, na cama,
sobre os acontecimentos surpreendentes e as
possíveis conseqüências; o pressentimento
quanto a perder o emprego, como um fantasma
a lhes rondar a privacidade, as horas
eventuais de descanso.
Edward R. Murrow, jornalista famoso por seu
caráter e sua atuação íntegra no rádio e na
tevê, é o protagonista da história,
brilhantemente interpretado por David
Strathairn. Nas décadas de 30 e 40, Murrow
também se notabilizou por combater o
fascismo e o nazismo.
No elenco, também se destacam: Patricia
Clarkson, George Clooney, Jeff Daniels,
Robert Downey Jr., Frank Langella.
Fiquei impressionada com as qualidades de
realização de "Boa noite e boa sorte"
(produção, pesquisa, direção, elenco,
interpretação, roteiro, diálogos, edição,
figurinos, maquiagem, reconstituição de
época, cenografia e trilha sonora).
E, sobretudo, absolutamente impressionada
com a seriedade da obra e a sua importância
como cinema de "revelação", protesto e
denúncia, aos que desconhecem os fatos ou
negligentemente se permitiram esquecer esses
acontecimentos dignos de contínua reflexão.
As situações e os temas não-ficionais de
"Boa noite e boa sorte" constituem um
cenário de conflitos historicamente
mascarados, com alguns aspectos importantes
quase invisíveis, inaudíveis, fora do
ambiente em que se movimentam os personagens
reais. Um clima sombrio no contexto do
período pós-guerra, assinalado pelas
suspeitas da chamada "guerra fria".
Cinema que cumpre a sua missão como
instrumento de informação e denúncia
insistente, para que todos aprendamos com a
verdade escondida ou disfarçada, nos
círculos governamentais, nas chefias dos
meios de comunicação, entre as autoridades
nacionais. História omitida, abafada e
arquivada por motivos indefensáveis, apesar
de seu potencial para repetição. Vulcão onde
apenas se colocou uma pedra, na vã tentativa
de impedir futuras erupções.
Já fui à pré-estréia de "Boa-noite e boa
sorte" preparada para apreciar e aplaudir,
entretanto, o filme de George Clooney
superou as minhas elevadas expectativas.
É de uma coragem surpreendente, que nos
comove até visceralmente, no mais íntimo de
nós mesmos, com sinceridade e sobriedade,
com ousadia incomparável, em sua forma
despojada e seu conteúdo manifesto. Sim, uma
ousadia surpreendente, se considerarmos que
o diretor, co-roteirista e intérprete -
George Clooney, cidadão estadunidense, atua
no cinema e na tv de seu país.
Expõe com objetividade e clareza os pontos
fracos da política de segurança de uma nação
aparentemente forte. E de sua sociedade,
fundamentada em anti-valores que nela seriam
inexistentes, mas de fato existem! São
forças de pressão, atuantes em todas as
esferas da realidade nacional.
Demonstra facilmente como a tv pode ser um
instrumento de embuste e ciladas para a
opinião pública. Conseguir e agradar aos
patrocinadores, aumentar os lucros...
orientam as decisões. O público é apenas o
mercado consumidor. Não se trata de formar
cidadãos, e sim, de aumentar os lucros, de
vender produtos, a qualquer preço. Eis o
caminho, também , para a covardia diante dos
poderosos, estejam esses donos do poder onde
estiverem.
E abre as portas dos estúdios, gabinetes e
redações, para que todos os cidadãos vejam e
ouçam como o desrespeito à verdade e aos
direitos inalienáveis da pessoa humana
ocorre, inclusive, na prática do jornalismo,
que deveria ser o seu baluarte.
No entanto, mesmo nesse deserto moral,
encontramos pessoas corajosas, íntegras e
conscientes.
São profissionais que não enganam, nem se
deixam enganar. Cidadãos cuja proposta ética
de vida é conscientizar, informar , educar o
público, e não, satisfazer o mercado
simplesmente, e não, divertir sem
compromissos, para que esse público se torne
cego à verdade que passa, perseguida como
criminosa...
Mais, não consigo falar, neste momento,
sobre "Boa noite e boa sorte"...que, como
cinema, assumiu esse dever de informar sem
hesitação.
Como também não consegui falar, nem me
levantar de imediato, para sair da sala de
exibição, por me sentir tão positivamente
perturbada, ao término da sessão
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