A FARSA - LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO
No cartaz do filme “All the President´s men”,
uma chamada bem interessante:
“A mais devastadora história de detetive deste
século.” E, de fato, foi o trabalho duro de
investigação dos repórteres Bob Woodward e Carl
Bernstein do Washington Post, que desnudou a
imensa rede de corrupção relacionada ao episódio
de Watergate, em 17 de junho de 1972 nos EUA.
Considerado o maior escândalo desse tipo no
país. “Todos os homens do Presidente” foi
dirigido por Alan J. Pakula, com roteiro de
William Goldman. Contou com um elenco de
primeira, capitaneado por Robert Redford e
Dustin Hoffman. Segundo a observação do livro
“Tudo sobre cinema” com edição geral de Philip
Kemp, as cenas internas da redação de jornal,
com os repórteres dando telefonemas e
datilografando, não constituíam um apelo visual
que empolgasse o público. No entanto, a direção
e todos os outros aspectos, inclusive a
fotografia de Gordon Willis, contribuíram para a
manter a atenção dos espectadores. Foi um
sucesso.
A lembrança do filme me leva aos dias atuais.
Salvo engano, é difícil compreender os motivos
pelos quais o Orçamento Secreto e as emendas
parlamentares não sejam investigadas com
profundidade pela imprensa. Um ou outro caso
chega à superfície, mas a matéria permanece
submersa nos meandros da obscuridade. Isso não é
absolutamente justo para com a sociedade.
Principalmente porque elas são custeadas com
dinheiro público; são excludentes porque
decididas sob critérios personalistas e não
técnicos; são ilegalmente invasivas, retirando
dinheiro do Orçamento Federal, de
responsabilidade do Executivo e sob o qual o
Parlamento tem a função de corrigir distorções,
não de se apropriar de recursos. E são,
finalmente, imorais, porque fundamentadas em um
só objetivo: fazer propaganda pessoal. Com
dinheiro dos impostos dos cidadãos, cuja renda
média é menor do que R$3.000,00.
Esse poço sem fundo das emendas e privilégios da
classe política se relacionam, de forma direta,
com a atual guerra do aumento dos servidores
públicos. E as controvérsias causadas pelas
afirmações do Presidente da República quanto a
dar aumento para somente um segmento da classe.
O Dr. Marco Aurélio explica que a Constituição
brasileira tem uma cláusula revelando que o
reajuste dos servidores “sempre será feito na
mesma data e linear.” (Correio Braziliense, de
29/12/2021.) Para completar, também no Correio
de hoje, o Presidente do Fórum Nacional das
Carreiras de Estado (Fonacate), dr. Rudinei
Marques, afirmou que as emendas do Relator (RP9)
e o Fundão Eleitoral juntos, possibilitariam
“uma recomposição salarial linear para os
servidores civis na ordem de 10%”. Senhores,
trata-se de um total de R $20 bilhões!
E qual o salário de um parlamentar? Cerca de R
$36.000,00. Mas lembrem-se que existem verba
indenizatória no valor de R $100.000,00 mensais
para contratação de “funcionários “, além de
muitos outros penduricalhos. O que transforma o
parlamento brasileiro no segundo mais caro do
mundo
Dos R $100.000,00, quanto permanece no bolso de
muitos parlamentares por conta das rachadinhas?
Lembrando, mais uma vez, que no Brasil a renda
média é menor do que R $3.000,00. E mais: os
benefícios sociais dos “funcionários” dos
gabinetes são pagos fora da verba indenizatória,
constituindo-se mais despesa para o Parlamento.
Compreensível? Ou seja, a despesa real para
contratação de pessoas por gabinete é muito
maior do que os R $100.000,00 E uma dúvida
cruel: por que se permite tal descentralização
na contratação de pessoal? Uma suposição:
trata-se de uma estrutura montada
especificamente para ludibriar e enriquecer o
parlamentar.
Emendas parlamentares, emendas de Relator e
Orçamento Secreto deveriam ser objeto de
investigação séria. A imprensa investigativa
poderia estar focada em desconstruir toda essa
estrutura de privilégios que torna uma piada de
mau gosto o interesse dos parlamentares com
Auxílio Emergencial ou mesmo com a justiça
social. E, pasmem, querem nos convencer de que o
Fundo Eleitoral e Partidário contribuem para a
democracia.Contribuir para a democracia é o
compromisso pela igualdade de oportunidades e a
busca incessante da justiça social. Precisamos
de muito menos partidos políticos. E que estejam
dispostos a sair da inação, lutando por sua
sobrevivência na luta do dia a dia da conquista
de seus eleitores. Com uma administração
profissional que lhes permita criar e manter
recursos para sobreviver. O contrário do
parasitismo e da dependência dos minguados
recursos do Estado. Compromisso democrático é um
Parlamento enxuto e sem privilégios. Precisamos
ficar atentos. E seria muito bom se a imprensa
aprofundasse a sua função investigativa.
(12/2021/) LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO |