ESTÃO QUERENDO
VIRAR A MESA
A impressão
que se tem, pelos fatos ocorridos em público
até agora, é que o STF dará, sim, um golpe
de Estado para
impedir um
segundo mandato de Bolsonaro
J. R. Guzzo
15 ABR 2022
Há um golpe de
Estado em preparação neste país e neste
momento, pouco a pouco e passo a passo. Não
se trata do velho
golpe militar
de sempre, com tanque de guerra,
paraquedista do Exército e pata de cavalo.
Também não será dado por uma
junta de
generais de quepe, óculos escuros e o peito
cheio de medalhas, que ocupa a central
telefônica, o prédio do correio
e a usina de
energia elétrica. Trata-se, aqui, de um
golpe em câmara lenta, a ser organizado na
frente de todo mundo e
executado,
justamente, pelos que se apresentam ao
público como os grandes defensores da
democracia, do Estado de direito
e do poder
civil — e que, no Brasil de hoje, se sentem
angustiados com a ameaça de perderem os
confortos que têm. É gente
que vem com
uma doutrina destes nossos tempos, e talhada
exatamente para a situação do Brasil de
hoje. Para salvar a
democracia,
dizem os seus pregadores, é preciso ignorar
as regras da democracia e anular, de um
jeito ou de outro, os
resultados da
eleição presidencial que será feita em
outubro próximo através do voto popular —
conforme for esse resultado,
é claro. Ou
seja: para haver democracia, é preciso que
não haja democracia.
De acordo com
essa maneira de ver a política de hoje,
eleições realmente livres são um perigo;
podem ser usadas por
antidemocratas
para chegarem ao governo, ou se manterem lá.
Em seguida, eles conseguem uma maioria no
Congresso
e aprovam as
leis que querem — aquelas, aliás, que
defenderam durante a sua campanha eleitoral
e que tiveram o apoio
de um
eleitorado incapaz de decidir, por seu
despreparo e outros vícios, o que é
efetivamente bom para o interesse nacional.
Vão nomear
ministros para o Supremo Tribunal Federal e
para os tribunais superiores que formam a
cúpula do Poder Judiciário,
em
substituição aos que tiverem de se aposentar
pela lei. Vão governar o Brasil dentro de
uma visão que parece democrática,
porque foi
aprovada pela maioria dos eleitores
brasileiros — mas que, na verdade, é contra
a democracia, por defender “pautas”
conservadoras
que não se encaixam no modelo de sociedade
democrática considerado correto pelos
gestores dessa doutrina.
São nada menos
que “o inimigo”, como disse textualmente o
ministro Luís Roberto Barroso, do STF, numa
palestra nos Estados
Unidos,
enquanto “nós somos a democracia”. (Leia as
prodigiosas declarações do ministro, com
mais detalhes, na matéria anterior.)
Não podem,
portanto, governar o país — e se, para
impedir que governem, for preciso bloquear,
degenerar ou falsificar as eleições,
pior para as
eleições. Vontade da maioria, nessa visão
moderna das coisas, não é tudo. Deve estar
subordinada ao valor mais alto
que é a
salvação da verdadeira democracia, tal como
ela é entendida segundo as suas novas
regras.
Ou é Lula, ou então é qualquer solução que
não seja Jair Bolsonaro
Esse golpe
está sendo montado pelos inimigos do
presidente da República e tem o objetivo de
impedir que ele seja reeleito
para um novo
mandato de quatro anos. A ideia geral é dar
a vitória para o seu único adversário real
na eleição, o ex-presidente
Lula –— ou, se
isso não for possível, pelo desenrolar dos
acontecimentos, então que o governo vá para
qualquer outra pessoa,
ou para
qualquer outra coisa, desde que não seja
“Ele”. Não utilizam essas palavras, é claro,
mas também está claro que é
exatamente
isso o que estão fazendo. A operação é
tocada em público. Seus principais agentes
são os ministros do Supremo
Tribunal
Federal e do alto aparelho judiciário de
Brasília. Logo em seguida vêm os políticos
do Brasil velho, bichado e inimigo do
progresso —
dos túmulos do PSDB a José Sarney, dos que
querem roubar e estão em síndrome de
abstinência, dos parasitas da
máquina
estatal, dos fracassados que precisam voltar
ao governo e afastar o risco de perderem o
resto de suas carreiras. O golpe
é apoiado
abertamente pela maior parte da mídia —
tanto os jornalistas como seus patrões. Traz
consigo, ainda, o consórcio
nacional
formado pelos empreiteiros de obras
públicas, os empresários-pirata, os ladrões
em geral, as classes intelectuais, as
empresas
aflitas com as questões de “gênero”, raça e
sustentabilidade, os artistas de novela e os
banqueiros de esquerda. Para
eles, de duas
uma: ou é Lula, ou então é qualquer solução
que não seja Jair Bolsonaro. E se, no fim de
todas as contas e apesar
de todos os
esforços, não der certo? Aí vai ser feito
tudo para impedir que ele governe o Brasil e
execute os projetos que a maioria
do eleitorado
aprova.
Um sinal deste golpe em armação, entre
outros tantos, é a pescaria em água suja que
começa a ser feita com o altíssimo
propósito de
melhorar as instituições. Entram aí a
conversa que você tem ouvido a respeito de
diminuir os poderes do presidente,
para
neutralizar na medida do possível os
resultados das eleições, ou de tornar mais
fácil o impeachment presidencial, o que é
muito útil no
caso do seu adversário ganhar. As duas
ideias são multiuso, ou seja, servem para
todas as circunstâncias. Se a
maioria do
eleitorado escolher Bolsonaro em outubro, os
agentes do golpe transformam os projetos em
prioridade absoluta —
como fazem com
essas CPIs delinquentes que criam do nada,
na tentativa de impedir que o governo
governe. Se o vencedor for
Lula, ambos os
assuntos são automaticamente esquecidos;
ninguém vai insistir em levar adiante nem um
e nem outro. É certo que,
pela atual
composição da Câmara de Deputados, essas
coisas são de aprovação muito difícil. É
certo, também, que o ministro
Barroso, um
propagador destacado da amputação dos
poderes do presidente, diz que isso não
seria para a próxima eleição, e sim
para o futuro.
Tudo bem, mas por que essa discussão tem de
começar justo agora? Falar em mudança de
regras seis meses antes
da eleição
nunca é coisa bem-intencionada — nunca,
mesmo que não dê em nada.
Outra trapaça é a tentativa de abrir uma
“CPI da Educação”, como houve a “CPI da
Covid”, que ficou nas primeiras páginas e
no
horário nobre
durante seis meses seguidos, acusou
Bolsonaro de nove crimes diferentes e, no
fim, não conseguiu gerar uma única
e miserável
queixa na polícia. Desta vez a desculpa é
“investigar a corrupção no Ministério da
Educação”. Não importa se há ou
não há
corrupção no Ministério da Educação, ou em
qualquer outro lugar, e menos ainda se a CPI
vai dar ou não na descoberta
de algum
delito real. O que importa, unicamente, é
fornecer à mídia a oportunidade de ficar
exibindo aos gritos, todos os dias,
“denúncias de
corrupção” contra o “governo Bolsonaro” —
daqui até o dia da eleição. No caso da “Covid”,
que foi uma agressão
tão grosseira
como essa, o presidente do Senado não queria
abrir CPI nenhuma. O ministro Barroso
ordenou que abrisse, com
objetivos
francamente políticos — uma interferência
direta nos direitos do Poder Legislativo,
aceita sem um pio pela presidência
da casa e
pelos demais senadores. Barroso mandou abrir
uma CPI contra Bolsonaro uma primeira vez.
Pode muito bem mandar
abrir uma
segunda, queira ou não queira o presidente
do Senado — uma nulidade que, quando se fala
em Supremo, morre de
medo até do
homem do cafezinho. Se não for Barroso, pode
ser outro ministro qualquer.
Quem quer votar em Bolsonaro é descrito como
fanático, incapaz de exercer o direito de
voto.
Essa “CPI da
Educação” começou da pior forma possível,
com falsificação de assinaturas e a histeria
habitual do senador
(do Amapá,
para se ter uma ideia da seriedade da coisa
toda) que a propôs. Como a discussão da
reforma “institucional”,
a “CPI” pode
dar em coisa nenhuma — mas mostra o extremo
empenho das tentativas de demolir a
candidatura do
presidente.
Bem mais concreta é a ofensiva para socar em
cima do Brasil, a qualquer custo, medidas de
repressão policial
contra as
chamadas “fake news” nas redes sociais — na
verdade, uma agressão direta à liberdade de
expressão, com o
objetivo
declarado de censurar as mensagens de
“direita” e prejudicar a campanha eleitoral
de Bolsonaro. As redes são o
único meio de
comunicação para ele — a mídia tradicional é
sua inimiga de morte desde a campanha de
2018, e continuará
sendo. O que
lhe sobram são as redes; é contra as redes,
portanto, que se dirige a repressão.
Naturalmente, vende-se a
ideia do
combate às “notícias falsas” como um gesto
de “defesa da democracia”. É exatamente o
contrário. Quem vai decidir
que uma
notícia é “falsa” e, portanto, deve ser
punida? O ministro Alexandre de Moraes e seu
inquérito perpétuo, e
rigorosamente
ilegal, contra as “fake news” e os “atos
antidemocráticos”? A mera ideia é absurda. O
ministro Ricardo
Lewandowski? O
Superior Tribunal Eleitoral? Aí é até pior.
O STE, além de contar com a presença dos
mesmos Moraes e
Lewandowski, é
presidido pelo ministro Edson Fachin, que
anulou as quatro ações penais contra Lula —
incluindo suas
condenações
pelos crimes de corrupção e lavagem de
dinheiro, em terceira e última instância, e
por nove juízes diferentes.
A imprensa, por sua vez, defende cada vez
mais abertamente algo tão parecido com um
golpe de Estado, mas tão parecido,
que não dá
mais para notar a diferença. É o que se vê
com a constante e maciça pregação segundo a
qual Bolsonaro não
“tem
condições” de ser presidente da República,
que “o país não aguenta” um segundo mandato,
que “a democracia não vai
sobreviver” à
sua vitória etc. etc. etc. Há, nessa
campanha, a negação pura, simples e
permanente de fatos objetivos. Além
do mais, quem
quer votar em Bolsonaro é descrito como
fanático, inimigo da democracia e incapaz de
exercer, por deficiência
mental ou
moral, o direito de voto — ou a liberdade de
escolher um candidato de sua preferência.
Não se admite mais na mídia,
simplesmente,
que seja lícito votar em Bolsonaro. É como
se os 58 milhões de brasileiros que votaram
nele em 2018 não
tivessem a
qualificação necessária para agir como
cidadãos. Na verdade, não se vê nada de
parecido na imprensa desde a
campanha de
Carlos Lacerda, patrono-mor da direita
nacional, contra Getúlio Vargas, santo
padroeiro da esquerda, na eleição
presidencial
de 1950. “Não pode ser candidato”, dizia
Lacerda. “Se for candidato, não pode ser
eleito. Se for eleito, não pode
tomar posse.
Se tomar posse, não pode governar”. Qual a
diferença?
A chave de tudo, porém, está no Supremo. A
impressão que se tem, pelos fatos ocorridos
em público até agora, é que o STF
dará, sim, um
golpe de Estado para impedir um segundo
mandato de Bolsonaro — caso chegue à
conclusão que pode dar
esse golpe, ou
seja, se tiver certeza de que todo mundo vai
baixar a cabeça se os ministros virarem a
mesa. Só não dará se
achar que não
consegue. Não há nada de tão extraordinário
assim nesse cenário. Fachin anulou todas as
condenações de Lula,
no que foi
possivelmente o ato mais insano da história
do Poder Judiciário no Brasil, porque achou,
e com toda a razão, que podia
fazer isso sem
a oposição real de ninguém. Alexandre de
Moraes acha que pode ir dobrando a aposta em
seu inquérito ilegal —
porque comete
absurdo em cima de absurdo contra as leis em
vigor no Brasil, a começar pela Constituição
Federal, e ninguém,
nem o
Congresso, nem o próprio Judiciário, diz
nada contra as suas decisões. O fato é que a
respeito de Fachin, Moraes,
Lewandowski e
Barroso sempre se pode esperar o pior
possível; pensando no conjunto da obra dos
quatro, é possível que
aconteça pior
do que se espera. O resto não melhora as
coisas em nada. Basta fazer a conta mais
óbvia de todas. Dos 11 atuais
ministros do
STF, sete foram nomeados por Lula e Dilma.
Dos quatro restantes, um é Gilmar Mendes e o
outro é Alexandre de
Moraes. Qual a
imparcialidade que se pode esperar,
honestamente, de um grupo como esse?
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