Data: |
Tue, 26 Jul 2005 20:51:34 -0300 |
Assunto: |
Alzheimer (O Mal do Século) |
Alzheimer (O Mal do Século)
Roberto Goldkorn - psicólogo e escritor.
Coluna Outro Lado - Um outro jeito de enxergar o
cotidiano
Meu pai está com Alzheimer. Logo ele, que durante
toda vida se dizia "o
Infalível". Logo ele, que um dia, (...).
Logo ele que repetiu, ao longo desses 54 anos de
convivência, o nome do
músculo do pescoço que aprendeu quando tinha treze
anos e que nunca mais
esqueceu: externocleidomastóideo.
O
diagnóstico médico ainda não é conclusivo, mas, para
mim, basta saber que
ele esquece o meu nome, mal anda, toma líquidos de
canudinho, não consegue
terminar uma frase, nem controla mais suas funções
fisiológicas, e tem os
famosos delírios paranóides comuns nas demências
tipo Alzheimer.
Aliás, fico até mais tranqüilo diante do "eu não sei
ao certo" dos
médicos; prefiro isso ao "estou absolutamente certo
de que...", frase que me
dá arrepios.
Há trinta anos, não ouvia sequer uma menção a essa
doença maldita.
Hoje, precisaria ter o triplo de dedos nas mãos para
contar os casos
relatados por amigos e clientes em suas famílias.
O
que está acontecendo?
Estamos diante de um surto de Alzheimer?
Finalmente nossos hábitos de vida "moderna" estão
enviando a conta?
O
que os pesquisadores sabem de verdade sobre a
doença?
Qual é o lado oculto dessa manifestação tão
dolorosa?
Lendo o material disponível, chega-se a uma
conclusão: essa é uma doença
extremamente complexa, camaleônica de muitas faces e
ainda carregada de
mistérios.
Sabe-se por exemplo, que há um componente genético.
Por outro lado, o Dr. William Grant fez uma pesquisa
que complicou um pouco
as coisas. Ele comparou a incidência da doença em
descendentes de japoneses
e
de africanos que vivem nos EUA, e com japoneses e
nigerianos que ainda
vivem em seus respectivos países. Ele encontrou uma
incidência da doença da
ordem de 4,1 para os descendentes de japoneses que
vivem na América, contra
apenas 1,8 de japoneses do Japão.
Os afro-americanos vão mais longe: 6,2 desenvolvem a
doença, enquanto apenas
1,4 dos nigerianos é atingido por ela.
Hábitos alimentares? Stress das pressões do 1º
Mundo? Mas o Japão não é 1º
Mundo? Não tem stress?
A
alimentação parece ser sem dúvida um elo nessa
corrente, e mais ainda o
alumínio.
Segundo algumas pesquisas, a incidência de alumínio
encontrada nos cérebros
de portadores da doença é assustadoramente alta.
Pesquisas feitas na Austrália e em alguns países da
Europa mostraram que,
em atos alimentados com uma dieta rica, o sulfato de
alumínio (comumente
colocado na água potável para matar bactérias)
danificou os cérebros dos
roedores de forma muito similar à causada nos
humanos pelo Alzheimer.
Pesquisas do Dr.Joseph Sobel, da Universidade da
Califórnia do Sul,
mostraram que a incidência da doença é três vezes
maior em pessoas expostas
à
radiação elétrica (trabalhadores que ficavam
próximos a redes de alta
tensão ou a máquinas elétricas).
Mas não param por aí as pesquisas, que apontam a
arma em todas as direções.
Porém, a que mais me chocou e me motivou a fazer
minhas próprias
elucubrações foi o estudo das freiras.
Esse estudo, citado no livro A Saúde do Cérebro, do
Dr. Robert Goldman, Ed.
Campus, foi feito pelo Dr. Snowdon, da Universidade
de Kentucky.
Eles estudaram 700 freiras do convento de Notre
Dame. Na verdade, eles
leram e analisaram as redações autobiográficas que
cada freira era
obrigada a escrever logo ao entrar na ordem. Isso
ocorria quando elas tinham
em média 20 anos.
Essas freiras (um dos grupos mais homogêneos
possíveis, o que reduz muito as
variáveis que deveriam ser controladas) foram
examinadas regularmente e seus
cérebros investigados após suas mortes.
O
que se constatou foi surpreendente. As que melhor se
saíram nos testes
cognitivos e nas
redações - em termos de clareza de raciocínio,
objetividade, vocabulário,
capacidade de expressar suas idéias, mesmo
apresentando os acidentes
neurológicos típicos do Alzheimer (placas e massas
fibrosas de tecido morto)
-
não desenvolveram a demência característica da
doença. Ou seja, elas
tinham as mesmas seqüelas que as outras freiras com
Alzheimer diagnosticado
(e que tiveram baixos escores em testes cognitivos e
na redação), mas
não os sintomas clássicos, como os do meu pai.
A
minha interpretação de tudo isso:
Não temos muito como controlar todos os fatores de
risco apontados como
vilões - alimentação, pressão alta, contaminação
ambiental, stress, e a
genética (por enquanto).
Mas podemos colocar o nosso cérebro para trabalhar.
Como? Lendo muito, escrevendo, buscando a clareza
das idéias, criando novos
circuitos neurais que venham a substituir os
afetados pela idade e pela vida
"bandida".
Meu conselho: não sejam infalíveis como o meu pobre
pai, não cheguem ao topo
nunca, pois dali, só há um caminho: descer.
Inventem novos desafios, façam palavras cruzadas,
forcem a memória, não só com drogas (não nego a sua
eficácia principalmente
as nootrópicas), mas correndo atrás dos vazios e
lapsos.
Eu não sossego enquanto não lembro do nome de algum
velho conhecido, ou de
uma localidade onde estive há trinta anos.
Leiam e se empenhem em entender o que está
escrito, e aprendam outra língua, mesmo aos sessenta
anos.
Não existem estudos provando que o Alzheimer é a
moléstia preferida dos
arrogantes, autoritários e auto-suficientes, mas a
minha experiência mostra
que pode haver alguma coisa nesse mato.
Coloquem a palavra FELICIDADE no topo da sua lista
de prioridades - 7 de
cada 10 doentes nunca ligaram para essas "bobagens"
e viveram vidas
medíocres e infelizes (muitos nem mesmo tinham
consciência disso).
Mantenha-se interessado no mundo, nas pessoas, no
futuro.
Invente novas receitas, experimente (não gosta de ir
para a cozinha? Hum...
preocupante).
Lute, lute sempre, por uma causa, por um ideal, pela
felicidade.
Parodiando Maiakovski ("melhor morrer de vodka do
que de tédio"), digo:
melhor morrer lutando o bom combate, que ter a
personalidade roubada pelo
Alzheimer.
E
inté amigos, vou me cuidar...
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