Theresa Catharina de Góes Campos

 
De: REYNALDO FERREIRA
Enviada: seg 5/12/2005 15:06

Repassando, RDF
O capitalismo é amoral. Ainda bem
Filósofo adverte para o perigo de transformar o mercado em religião
POR OSCAR PILAGALLO

Há muita conversa, hoje em dia, sobre responsabilidade social da empresa, sobre ética empresarial, sobre moral no mundo dos negócios. O que significa isso? Numa palavra: marketing.

O capitalismo, por natureza, não é moral. Nem imoral. Não é isso o que importa. O que importa é ganhar dinheiro, gerar lucro. Essa é a essência do sistema econômico hoje hegemônico. Outros aspectos são periféricos. O capitalismo é amoral.

Talvez não haja muita novidade nesse enfoque, mas num momento em que a defesa da moral empresarial virou um negócio lucrativo é oportuno o lançamento do livro do filósofo francês André Comte-Sponville, que desconfia do discurso que tenta camuflar o real propósito do capitalismo.

Antes de criticar Comte-Sponville, os empresários "socialmente corretos", para quem a idéia do amoralismo econômico causa desconforto, devem saber que o autor acha positiva a dissociação entre o mundo dos negócios e o da moral.

Que uma coisa não tem a ver com outra parece claro: não é a moral que determina os preços, é a lei da oferta e da procura; não é a virtude que cria o valor, é o trabalho. Mas a empresa não deve gerar emprego? Sim, mas só se o empregado gerar valor maior que seu salário (a mais-valia descrita por Marx). E o cliente não deve ser satisfeito? Sim, mas não é para satisfazer o cliente que se quer satisfazer o dono da empresa, o acionista; é o contrário: é para satisfazer o acionista que se quer satisfazer o cliente.

O capitalismo é antipático. Enriqueça. Seja egoísta. Aja segundo seus interesses. Se cada um cuidar de si, a sociedade progride economicamente. Essa é a lógica do capitalismo. Cruel e perversa, a realidade é que apenas reflete a natureza humana. Essa é a origem de sua eficácia, relativamente superior à do socialismo, tal como foi experimentado no século passado.

E, no entanto, é o socialismo, esse sim, que tem a ver com moral, pelo menos em sua concepção. Para o comunismo triunfar seria necessário que as pessoas deixassem de ser egoístas e pusessem o interesse geral acima do interesse particular. Como isso não acontece voluntariamente, recorreu-se à coerção. O totalitarismo não seria, portanto, apenas um desvio de rota. "É assim que se passa da bela utopia marxista, no século XIX, ao horror totalitário que todos conhecem, no século XX", escreve Comte-Sponville. "O erro simpático e nefasto de Marx foi o de querer erigir a moral em economia."

O filósofo, que flertou com o comunismo na juventude dos anos 60, fala da perspectiva de um liberal de esquerda, como se define. Ele explica o que entende por isso: "Os liberais de esquerda são os que constatam o fracasso do marxismo, sem renunciar com isso a agir pela justiça (inclusive a justiça social) e pela liberdade (inclusive a liberdade econômica)".

Para Comte-Sponville, a moral numa sociedade capitalista deve ser procurada fora da esfera econômica. "Querer fazer do capitalismo uma moral seria fazer do mercado uma religião e da empresa, um ídolo. Se o mercado virasse uma religião, seria a pior de todas, a do bezerro de ouro. E a mais ridícula das tiranias, a da riqueza."
Esse é o perigo do marketing da moral.

 

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